Vamos falar sobre The Batman

Olá,

Vocês me conhecem e SABEM que pra mim toda história é política. Sim, até piada de papagaio. Aliás, eu diria que SOBRETUDO piada de papagaio.

Essa é muito especial pra mim

Com isso em mente, eu acho curioso que, de todos os super-heróis que são adaptados pra tela grande em lançamentos milionários pro mundo inteiro, o Batman hoje é o personagem mais associado a política e a comentários sociais. A culpa, claro, é de Christopher Nolan e Zack Snyder, responsáveis pelas grandes adaptações do personagem pro cinema nos últimos quase 20 anos.

Pelo amor de deus

Nolan e Snyder não são os únicos homens brancos culpados por todos os nossos problemas. Frank Miller, Jeph Loeb e Alan Moore escreveram algumas das histórias mais icônicas do Batman nos quadrinhos - todas elas com forte teor político, embora cada uma com um… “sabor” específico.

kk

Mas um outro aspecto interessante de quadrinhos como Batman: Ano 01, O Longo Halloween e A Piada Mortal é que eles funcionam bem isoladamente. Um leitor casual pode começar a ler qualquer um deles sem precisar se inteirar das confusas continuidades e linhas do tempo malucas de quadrinhos de super-herói. Essas histórias são acessíveis e, por isso, populares. Ok, não só por isso, mas a acessibilidade é um fator importante e acaba influenciando os roteiros dos filmes, mesmo quando eles não são diretamente baseados nessas histórias.

O resultado é que, querendo ou não, um filme live-action do Batman hoje PRECISA ser político. O que é bem estranho, considerando que a gente tá falando de um homem bilionário que se veste de morcego pra “fazer justiça com as próprias mãos”: pra entrar na casa dos outros sem mandado e pra fazer o que a polícia “não pode” fazer porque nossa, como burocracia e processos legais ATRAPALHAM a justiça.

Bandido bom é bandido espancado por forças para-militares

O novo filme do Batman não se preocupa muito com essas contradições, mas - como todo filme live-action do personagem lançado nos últimos 20 anos - ele se preocupa com política, com questões sociais. Ou pelo menos ele quer transparecer essa preocupação.

Nessa versão da história, somos levados de volta à cidade de Gotham que é mais uma vez representada como a epítome da decadência moral humana. Criminalidade, violência e corrupção atingem níveis tão absurdos que um herdeiro de uma família rica decide se tornar um vigilante mascarado e investigar as raízes dos problemas ao lado do único policial honesto da cidade. A própria polícia e os agentes da lei são comprados pela máfia e quem mais sofre com isso, claro, são pessoas pobres e marginalizadas, como Selina Kyle, a Mulher-Gato, que teve sua mãe assassinada por um grande chefe do crime. 

Mas os ricos sofrem também, poxa. Bruce Wayne viu seus pais serem assassinados quando criança e lidou com esse trauma construindo um aparato de guerra no quintal de casa. Estamos TODOS no mesmo barco.

Tem um momento do filme que dá a entender que a própria família Wayne tinha uma relação corrupta com a máfia, mas esse “mal-entendido” é rapidamente desmentido pelo mordomo. A culpa dos problemas de Gotham não é dos mais ricos, mas sim dos imigrantes, dos degenerados e das pessoas que sofrem injustiças, mas decidem reagir de forma “extrema” se “igualando” a seus algozes.

O principal vilão do filme é o Charada, que nessa versão é retratado como um incel de fórum que conduz uma operação terrorista com apoio da “comunidade” online pra em tese trazer justiça e retribuição para os mais ricos. É a tentativa do filme de se conectar com questões mais contemporâneas, de trazer o Batman pro mundo hipertecnológico onde a gente vive. Mas a trama falha em fazer um comentário pertinente sobre esses problemas ao retratar o “incel de fórum” como um problema isolado e ao “esquecer” a conivência e cumplicidade das empresas de tecnologia com esse tipo de fenômeno. O “incel de fórum” não é um efeito colateral do avanço tecnológico, é um sintoma do hipercapitalismo, um fenômeno comportamental que muitas vezes é alimentado pela imprensa e pelas big techs.

E sendo bem sincero? Eu adoraria ver um filme do Batman que abordasse essas questões? Mas não foi esse filme que eu assisti. Talvez eu esteja esperando demais de filme de boneco mesmo. A culpa é minha.

Conforme as coisas forem acontecendo eu vou avisando.

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